segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Fwd: Por que será que os Portugueses não anunciaram antes a descoberta do Brasil?

Desde 1490: portugueses no Brasil

Por mais que Afonso Schmidt queira esconder-se na pele do simples ficcionista, sua última novela, O Enigma de João Ramalho, a começar do título, representa a colocação de um problema histórico. Primeiro lançamento do Clube do Livro neste ano, traz um prefácio do diretor da editora. Nesse prefácio, que habitualmente tem o título modesto de "nota explicativa", Mário Graciotti explica que Schmidt "Não só apresenta uma tese arrojada e atraente, a de que os portugueses do século XV já teriam povoado, em 1490, antes mesmo de Colombo, as terras americanas, mas ainda nos recorda a remota e presente figura de João Ramalho

Texto de Herculano Pires. Fotos de Álvaro Costa

Schmidt escreve a sua novela, por assim dizer, na "linha justa" do parecer de Theodoro Sampaio, aprovando a tese de João Mendes Júnior, quanto à origem judaica de Ramalho. O futuro alcaide-mór de Santo André e de São Paulo de Piratininga é apresentado como expulso de Portugal num grupo de marranos, ou excomungados, que são enviados para longe. A caravela portuguesa que os traz vem abandoná-los no litoral paulista. E começa então a posse da América pelos portugueses, embora degredados.

Graciotti, que há tempos vem investigando os primórdios da navegação portuguesa, tendo escrito primorosos capítulos sobre as caravelas, em seu livro de viagem a Portugal, recentemente premiado em Lisboa, apóia a tese de Schmidt. E pergunta: "Por que D. João II não ajudava Colombo, se Portugal tinha quase setenta anos de domínio do Atlântico e ardia na febre dos descobrimentos? A resposta estaria aqui, nas páginas do romancista, como esteve, outrora, no famoso testamento de João Ramalho: em 1490, portugueses já povoavam de quilhas e de homens os mares e as terras americanas".

Enigma do nome - João Ramalho é enigma a partir do nome. Por que Ramalho, se conhecemos a sua procedência, como filho de João Velho Maldonado? Schmidt explica assim o novo nome: "Os da paróquia alcunharam-no de Ramalho ou Ramalhudo, numa alusão às barbas, bigodes e cabelos arrepiados". Um apelido que lhe fora posto em Vouzela, sua vila natal, onde o futuro patriarca se casara com Catarina Fernandes.

Esse Ramalhudo estava destinado a varar mundo e deitar seus ramos além-mar, em terras desconhecidas. Deixaria Catarina no termo de Coimbra, chorando o desterro do marido, para casar-se no Planalto com uma princesa indígena, Bartira ou Potira, filha do rei Tibiriçá. E uma vez conquistada a nova terra, nela se manteria como um agente da política secreta de D. João II, a que se referem Jaime Cortesão e Pedro Calmon. Tornando-se genro do Rei, o marrano Ramalho assumia a posição de príncipe-regente, como depois a história no-lo apresenta, em seu domínio fortificado de Santo André da Borda do Campo.

Pode parecer estranho que um degredado de origem judaica assumisse as funções, embora de maneira forçada, de representante secreto do monarca português nas terras virgens. Mas acontece que a política de D. João II, no tocante aos judeus, era mesmo ambivalente. Admitiu-os em Portugal e chegou a dar-lhes incumbências importantes, antes que se desencadeasse a perseguição religiosa que roubou ao País a glória de ter como seu filho o filósofo Espinosa. Não admira, pois, que atendendo aos interesses momentâneos do Reino, mandasse osmarranos para fora, mas deles se utilizasse na distância.

Enigma da assinatura - As atas da Vila de Santo André da Borda do Campo, atas da Vereança, de que nos restam apenas "um rendilhado feito pelas traças", deixam ver, entretanto, dezenove assinaturas de João Ramalho, figurando em todas elas o sinal-distintivo do kaf judaico. Alguns admitem que as assinaturas são apenas o nome dos vereadores, escritos pelo escrivão, mas Schmidt entende que há poucas possibilidades de haver escrivães disponíveis na vila, e propõe: "Segundo parece, quem escrevia seus nomes era João Ramalho. No entanto, o alcaide-mor, ao lançar a sua rubrica, riscava com pulso firme aquela ferradura deitada, com a abertura voltada para a esquerda. Era o kaf, a sua derradeira afirmação de judeu".

kaf, letra hebraica, equivale ao kapa grego e ao nosso k, hoje banido do alfabeto. Em reportagem anterior mostramos a importância que Horácio de Carvalho deu ao aparecimento dessa letra na assinatura de Ramalho, como sinal cabalístico, indicativo da posição do patriarca na Ciência Secreta Hebraica. Esse sinal era ao mesmo tempo um talismã, que dava poder e abria caminho à riqueza. Daí João Ramalho usá-lo na assinatura, como o auxílio secreto de que dispunha para enfrentar a terra nova e seus perigos, bem como a ambição e as ameaças constantes dos homens brancos que chegavam, cada vez em maior número.

Enigma de Schmidt - Diante desses enigmas, e de todos os que cercam a figura semi-lendária de João Ramalho, o escritor Afonso Schmidt se coloca também numa posição enigmática. Recusa-se a tomar uma decisão como historiador, limitando-se a dizer e a escrever que nada mais fez do que uma "novelazinha fantasiosa". Mas, no posfácio que escreveu para a novela, recomenda aos interessados o exame do parecer de Theodoro Sampaio sobre o caso do kaf.

Schmidt não quer complicações. Evita provocar debates históricos. Lembra que escreveu muitas outras novelas do mesmo gênero, sem pretensões a firmar ou defender teses. Mas é evidente que a sua novela coloca novamente em foco o "Enigma de João Ramalho", como se vê do próprio título do livro. O Patriarca de São Paulo - apontado também como o verdadeiro fundador da cidade, como o fez ainda agora o poeta Guilherme de Almeida, em crônica publicada no jornal O Estado de S. Paulo - continua, assim, a desafiar os investigadores e os estudiosos de nossos problemas históricos.

Política secreta de D. João II: povoar o Brasil antes da descoberta




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Mauro Demarchi
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